Avós podem ser considerados herdeiros do falecido, caso o falecido não tenha filhos e seja casado?
A sucessão hereditária determina quem é considerado herdeiro do falecido, e tem por base as relações familiares de uma pessoa. Isso significa que a legislação brasileira não elenca que amigos ou pessoas próximas do falecido e que não sejam da família possam ser consideradas herdeiras. Esta é uma regra que pode não parecer justa, pois, afinal, é comum que pessoas que não tenham qualquer nível de proximidade tenham direito à herança, enquanto aqueles que estão dia após dia acompanhando o indivíduo não tenham direito a qualquer parte dos bens. E, dentro deste cenário, surge o questionamento: seria possível que os avós do falecido sejam herdeiros do falecido, caso ele não tenha filhos e nem cônjuge? Segundo o Código Civil, isto é possível.
A ordem de sucessão
Nos termos do art. 1.829 do Código Civil, a ordem da sucessão é a seguinte: 1) se o falecido tiver cônjuge, seus herdeiros serão os descendentes e o cônjuge; 2) se o falecido não tiver filhos, mas for casado, seu cônjuge e seus ascendentes serão herdeiros; 3) se não possuir filhos, nem pais ou avós, o cônjuge será o único herdeiro; 4) caso o falecido seja solteiro, os colaterais serão seus herdeiros (irmãos e tios).
Um ponto importante é que a legislação utiliza os termos descendentes e ascendentes. Assim, qualquer um que esteja abaixo da linha sucessória (filhos, netos, bisnetos, etc.) é considerado descendente, e qualquer um que esteja acima da linha sucessória (pais, avós, bisavós, etc.) é considerado ascendente. Logo, a resposta para a pergunta inicial é de que sim, os avós podem ser considerados herdeiros do falecido, mas somente se ele não tiver deixado filhos ou netos. Além disso, mesmo que o falecido seja casado, mas não tenha descendentes, é possível que os avós sejam herdeiros.
E se o falecido tiver deixado testamento?
O planejamento sucessório visa antever a forma como os bens do falecido serão partilhados. Existem diversos meios de este plano ser posto em ação, mas o mais conhecido é o testamento.
O testamento, por sua vez, permite que o indivíduo disponha de somente 50% do seu patrimônio, dado que, necessariamente, a outra metade deve ser destinada aos herdeiros necessários. Com isso, no caso em apreço, mesmo que o falecido tenha deixado testamento, caso ele não tenha filhos ou netos, seus avós (caso sejam vivos) herdarão uma parte do patrimônio deixado.
O que diz a jurisprudência?
Muito embora os ascendentes sejam considerados herdeiros do falecido, uma regra importante do Código Civil é que o imóvel deixado pelo falecido e que seja de uso de moradia de seu cônjuge ou companheira permaneça com ela, para garantir o direito de habitação.
Vejamos uma decisão do TJSP que determinou que, mesmo que o cônjuge sobrevivente tenha um imóvel particular, deve ser garantido o seu direito de habitação no imóvel:
INVENTÁRIO – Autora da herança que não deixa descendentes e sim apenas companheira e dois ascendentes (genitores), ambos vivos no momento de abertura da sucessão – Incidência da regra do art. 1.829, II, do Código de Processo Civil, cuja aplicação é feita tanto para cônjuges quanto para companheiros supérstites, inexistindo qualquer inconstitucionalidade em seu teor – Concorrência que não possui restrição em relação ao regime de bens do relacionamento, tornando irrelevante existir ou não bem particular da "de cujus", não se confundindo com a hipótese do inciso I do art. 1.829 do CPC, que versa sobre cônjuge/companheiro e descendentes – Companheira que faz jus à meação e a parte do acervo hereditário – Direito real de habitação – Pedido formulado pela companheira sobrevivente – Deferimento – Insurgência de outra herdeira – Não acolhimento – Imóvel inventariado que servia de moradia do casal, permanecendo, após o falecimento indicado no processo, como residência da companheira supérstite – Inteligência do art. 1.831 do Código Civil – Único imóvel indicado no inventário e irrelevância de eventual propriedade particular de outro imóvel em nome da inventariante – Pretensão de arbitramento de aluguel por uso exclusivo do veículo do espólio que extrapola limites do inventário, pois depende de dilação probatória específica, que deve ocorrer em via ordinária, conforme art. 612 do CPC – Recurso improvido. (TJSP; Agravo de Instrumento 2296553-96.2020.8.26.0000; Relator (a): Alvaro Passos; Órgão Julgador: 2ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional III - Jabaquara - 1ª Vara da Família e Sucessões; Data do Julgamento: 01/03/2021; Data de Registro: 01/03/2021)
Conclusão
O planejamento sucessório é uma via que garante que a pessoa que não tenha filhos ou cônjuge destine seus bens a quem entender por direito. O plano a ser desenvolvido depende de cada caso e é por isso que o aconselhamento por profissional especialista no assunto é de extrema importância.